Segue o texto de Bruno Porciúncula, publicado no site Salvador da Bahia - Minha Cidade. Abaixo, foto de 1950 publicada no site As Características do Bonde.
"Rua Chile: centro de elegância, fonte de história
por Bruno Porciuncula
Construída em 1549, por Tomé de Souza, primeiro governador-geral do Brasil, com o nome de Rua Direita dos Mercadores, a Rua Chile foi a principal rua de Salvador. A cidade ainda era cercada de muros, com fossos, e possuía duas entradas, a do sul - conhecida como Porta de Santa Luzia e a do norte - chamada de Porta de Santa Catarina. Existiam duas praças e seu aspecto era de um quadrilátero.
A Rua Chile, com seus 400m de extensão, ganhou o nome definitivo através da Lei 577, de 16 de julho de 1902 - uma homenagem da Câmara Municipal à visita da esquadra da Marinha de Guerra do Chile que havia desfilado na cidade e, na época, era a terceira maior do mundo. Antes disso ela chegou a ter catorze nomes diferentes como Rua Direita do Palácio e Rua dos Mercadores. Tendo sua iluminação elétrica inaugurada em 1903, com grande festa, a Rua Chile se transformou em palco da própria evolução de Salvador.
Todo o poder da cidade estava concentrado nela: o Palácio dos Governadores, a Câmara Municipal e a Prefeitura. Politicamente, a rua era o centro das decisões, além de ser o eixo que ligava a Praça Castro Alves ao Centro Administrativo da Cidade. Empresas jornalísticas tinham sua sede no local, advogados, médicos, todos os grandes profissionais possuíam escritórios e consultórios em suas ruas estreitas.
Em 1912, o conflito entre militares do governo da Bahia e as forças federais deixou a rua destruída, com lojas incendiadas e prédios arruinados. Em 1915, com a reforma do Palácio dos Governadores, a Rua Chile foi reinaugurada. Mais larga, asfaltada, com trilhos de bondes no sentido ida e volta, arquitetura moderna para a época, lojas, iluminação elétrica o estilo parisiense, o lugar estava pronto para voltar a misturar trabalho e vida social.
Carnaval agitava a Rua Chile
Era no Teatro São João que o carnaval de Salvador começou a dar seus primeiros passos, ainda sem os famosos trios-elétricos. Eram realizados arrojados bailes de mascarados, na noite de sábado, iniciando as festas com músicas baseadas em trechos da ópera italiana "La Traviata". Em seguida, eram tocadas valsas, polcas e quadrilhas. O evento contava com a participação das pessoas de bom nível social, que tocavam nos bailes realizados em suas casa perto do teatro.
Como nem todos tinham poder aquisitivo para brincar o carnaval no teatro, mascaras de carnaval eram distribuídos gratuitamente na rua. Em 1878, o grupo de carnaval de rua "Os Cavaleiros da Noite" aparecia pela primeira vez num salão em grande forma, no próprio Teatro São João, causando alvoroço nas pessoas. Com o aumento da população para 120 mil pessoas, em 1880, a Rua Chile não comportava mais o carnaval e o Campo Grande virou o novo ponto, onde os foliões se encontravam e de lá saiam pela cidade.
Badalação em suas estreitas ruas
Nos anos 20, a rua já representava para Salvador o que Rua do Ouvidor representava para o Rio de Janeiro ou a 15 de novembro para São Paulo. Todo final de tarde os bondes paravam na Praça da Sé, trazendo rapazes e moças para "badalar". Seus hotéis de luxo como o Palace - que possuía um salão onde jovens passavam as tardes -, o Meridional, o Chile e o Cintra recebiam turistas de todas as partes do mundo. Grandes cacauicultores freqüentavam seus bares e o Teatro São João, onde se apresentavam companhias de teatro, principalmente, da França e Itália.
Nas décadas de 40 e 50, apogeu da Rua Chile, os cines Glória e Guarany trouxeram os maiores sucessos de Hollywood. E foi lá também que Dodô e Osmar mostraram para a cidade a Fobica, o primeiro trio elétrico. Em 100 anos a Rua Chile viu nascer vários personagens que se eternizaram na memória popular, como Florinda, a mulher do roxo. Conta a lenda que ela teria perdido sua fortuna e enlouquecido. Ao certo, sabe-se que por mais de 30 anos, ela desfilou o seu traje de veludo roxo e grosso em pleno sol de Salvador, pedindo esmolas na área.
As sapatarias Clark e Buffoni, a Chapelaria Mercuri, a Livraria Magalhães, as magazines Duas Américas, com suas escadas rolantes modernas, e Slooper, as lojas A Pérola e A Moda eram alguns dos lugares mais visitados por gerações de moradores de Salvador. A sorveteria A Cubana, a pastelaria Pepe e Irmãos. A tradicional loja de roupas masculinas, o Adamastor, vendia as roupas que os homens elegantes usavam. E teve, como seu primeiro dono, o pai do cineasta Glauber Rocha, cujo nome é o mesmo da propriedade. A família Lopes Pontes, de Irmã Dulce, viveu ali. A cantora lírica Bidu Sayão cantou no cine-teatro Jandaia e a Miss Brasil Marta Rocha comprou sua aliança de casamento na joalheria Nóvoa.
Com a mudança, na década de 70, do Centro Administrativo para a Paralela, a construção de Shopping Centers e o crescimento desordenado da cidade, a Rua Chile começou a entrar em declínio, sendo tombada pela Unesco como Patrimônio da Humanidade".
"Rua Chile: centro de elegância, fonte de história
por Bruno Porciuncula
Construída em 1549, por Tomé de Souza, primeiro governador-geral do Brasil, com o nome de Rua Direita dos Mercadores, a Rua Chile foi a principal rua de Salvador. A cidade ainda era cercada de muros, com fossos, e possuía duas entradas, a do sul - conhecida como Porta de Santa Luzia e a do norte - chamada de Porta de Santa Catarina. Existiam duas praças e seu aspecto era de um quadrilátero.
A Rua Chile, com seus 400m de extensão, ganhou o nome definitivo através da Lei 577, de 16 de julho de 1902 - uma homenagem da Câmara Municipal à visita da esquadra da Marinha de Guerra do Chile que havia desfilado na cidade e, na época, era a terceira maior do mundo. Antes disso ela chegou a ter catorze nomes diferentes como Rua Direita do Palácio e Rua dos Mercadores. Tendo sua iluminação elétrica inaugurada em 1903, com grande festa, a Rua Chile se transformou em palco da própria evolução de Salvador.
Todo o poder da cidade estava concentrado nela: o Palácio dos Governadores, a Câmara Municipal e a Prefeitura. Politicamente, a rua era o centro das decisões, além de ser o eixo que ligava a Praça Castro Alves ao Centro Administrativo da Cidade. Empresas jornalísticas tinham sua sede no local, advogados, médicos, todos os grandes profissionais possuíam escritórios e consultórios em suas ruas estreitas.
Em 1912, o conflito entre militares do governo da Bahia e as forças federais deixou a rua destruída, com lojas incendiadas e prédios arruinados. Em 1915, com a reforma do Palácio dos Governadores, a Rua Chile foi reinaugurada. Mais larga, asfaltada, com trilhos de bondes no sentido ida e volta, arquitetura moderna para a época, lojas, iluminação elétrica o estilo parisiense, o lugar estava pronto para voltar a misturar trabalho e vida social.
Carnaval agitava a Rua Chile
Era no Teatro São João que o carnaval de Salvador começou a dar seus primeiros passos, ainda sem os famosos trios-elétricos. Eram realizados arrojados bailes de mascarados, na noite de sábado, iniciando as festas com músicas baseadas em trechos da ópera italiana "La Traviata". Em seguida, eram tocadas valsas, polcas e quadrilhas. O evento contava com a participação das pessoas de bom nível social, que tocavam nos bailes realizados em suas casa perto do teatro.
Como nem todos tinham poder aquisitivo para brincar o carnaval no teatro, mascaras de carnaval eram distribuídos gratuitamente na rua. Em 1878, o grupo de carnaval de rua "Os Cavaleiros da Noite" aparecia pela primeira vez num salão em grande forma, no próprio Teatro São João, causando alvoroço nas pessoas. Com o aumento da população para 120 mil pessoas, em 1880, a Rua Chile não comportava mais o carnaval e o Campo Grande virou o novo ponto, onde os foliões se encontravam e de lá saiam pela cidade.
Badalação em suas estreitas ruas
Nos anos 20, a rua já representava para Salvador o que Rua do Ouvidor representava para o Rio de Janeiro ou a 15 de novembro para São Paulo. Todo final de tarde os bondes paravam na Praça da Sé, trazendo rapazes e moças para "badalar". Seus hotéis de luxo como o Palace - que possuía um salão onde jovens passavam as tardes -, o Meridional, o Chile e o Cintra recebiam turistas de todas as partes do mundo. Grandes cacauicultores freqüentavam seus bares e o Teatro São João, onde se apresentavam companhias de teatro, principalmente, da França e Itália.
Nas décadas de 40 e 50, apogeu da Rua Chile, os cines Glória e Guarany trouxeram os maiores sucessos de Hollywood. E foi lá também que Dodô e Osmar mostraram para a cidade a Fobica, o primeiro trio elétrico. Em 100 anos a Rua Chile viu nascer vários personagens que se eternizaram na memória popular, como Florinda, a mulher do roxo. Conta a lenda que ela teria perdido sua fortuna e enlouquecido. Ao certo, sabe-se que por mais de 30 anos, ela desfilou o seu traje de veludo roxo e grosso em pleno sol de Salvador, pedindo esmolas na área.
As sapatarias Clark e Buffoni, a Chapelaria Mercuri, a Livraria Magalhães, as magazines Duas Américas, com suas escadas rolantes modernas, e Slooper, as lojas A Pérola e A Moda eram alguns dos lugares mais visitados por gerações de moradores de Salvador. A sorveteria A Cubana, a pastelaria Pepe e Irmãos. A tradicional loja de roupas masculinas, o Adamastor, vendia as roupas que os homens elegantes usavam. E teve, como seu primeiro dono, o pai do cineasta Glauber Rocha, cujo nome é o mesmo da propriedade. A família Lopes Pontes, de Irmã Dulce, viveu ali. A cantora lírica Bidu Sayão cantou no cine-teatro Jandaia e a Miss Brasil Marta Rocha comprou sua aliança de casamento na joalheria Nóvoa.
Com a mudança, na década de 70, do Centro Administrativo para a Paralela, a construção de Shopping Centers e o crescimento desordenado da cidade, a Rua Chile começou a entrar em declínio, sendo tombada pela Unesco como Patrimônio da Humanidade".
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